ATLAS

 

 

E-books:

 

BREVE HISTÓRICO DA ANATOMIA COMPARATIVA DE VERTEBRADOS NA BIOLOGIA DA UnB:
UM PROJETO INTEGRADO DE ENSINO, PESQUISA E EXTENSÃO
Nos cursos de graduação em ciências biológicas, via de regra, a Anatomia de Vertebrados é abordada em disciplinas de zoologia. No entanto, por se tratar de uma grande área do conhecimento, com ampla abrangência temática, a parte dedicada à anatomia é reduzida e se atém aos principais caracteres sinapomórficos e adaptativos de representantes dos grandes grupos de vertebrados. Anatomia humana também aparece em currículos de diversos cursos de biologia e traz importante contribuição para a formação biológica, especialmente para o currículo de licenciatura.

Quando ingressei na Universidade de Brasília, em 1985, os currículos de bacharelado e de licenciatura não contemplavam nenhuma disciplina de anatomia. Nesse contexto, passei a ministrar fisiologia geral para ciências biológicas, tarefa que logo se mostrou árdua e, por vezes, infrutífera, dada a falta de base anatômica dos estudantes. Esse quadro perdurou até 1993, quando, então, criei a disciplina Anatomia Animal para o curso noturno de licenciatura em ciências biológicas, que então se iniciava. Essa disciplina tratava da anatomia de vertebrados em sentido amplo, com abordagem comparativa por sistema orgânico, de modo a explorar a diversidade biológica e abrir caminho para a exploração de aspectos evolutivos e filogenéticos, temas basilares e de grande interesse para a formação do biólogo. De início, o primeiro impacto foi verificar que a literatura acessível não contribuía para a implementação do modelo pretendido.

Os grupos de vertebrados eram representados por espécies “modelo”, o que limitava sobremaneira o estudo focado em diversidade. Passamos, então, a produzir nosso acervo de peças anatômicas com base em material biológico, especialmente peixes, aves e mamíferos, adquiridos no comércio local. Anfíbios e répteis foram sendo incorporados com aproveitamento de espécimes descartados de projetos de pesquisa desenvolvidos na própria UnB. Docentes e técnicos da Faculdade de Ciências da Saúde doaram um pequeno, mas representativo, conjunto de peças anatômicas humanas. Veterinários e biólogos do Jardim Zoológico de Brasília cederam uma diversidade de peças retiradas de animais necropsiados. Assim, de posse desse acervo básico, passamos a produzir fotografias que permitissem explorar didaticamente o material disponível e, principalmente, suprir a carência de boas imagens anatômicas de peixes, anfíbios e répteis nas publicações zoológicas. Os resultados obtidos passaram a compor as primeiras versões dos Roteiros de Aulas Práticas da Anatomia Animal, editados semestralmente.

Esse foi o embrião de um processo que durou cerca de uma década, finda a qual, passamos a assumir a anatomia comparativa como área de pesquisa, fundando o Laboratório de Anatomia Comparativa de Vertebrados, LACV – UnB. O interesse pela anatomia animal, a habilidade com as dissecações e o gosto pela fotografia foram o arcabouço necessário para meu desenvolvimento na anatomia, com forte dose de autodidatismo. Além disso, a experiência adquirida com preparações farmacológicas, ao longo de anos dedicados à pesquisa de compostos bioativos de pele de anfíbios, foi determinante no desenvolvimento de métodos diferenciais, com uso de preparações a fresco. Três fatores contribuíram positivamente, para o avanço nessa direção: 1. a percepção de que havia um grande potencial no uso didático desse material; 2. a possibilidade de ensinar anatomia com redução do uso de animais; 3. a possibilidade de ampliação do alcance desse projeto para além das fronteiras da UnB.

Os primeiros projetos de Iniciação Científica e de mestrado focavam nos anfíbios, grupo com o qual tínhamos maior identidade. No entanto, a partir da criação da Anatomia Animal para a pós-graduação, o interesse dos pós-graduandos por outros grupos ampliou nossos horizontes. Inicialmente com serpentes, em seguida com crocodilianos e lagartos. O aumento da atividade no LACV contribuiu sobremaneira para aumento do acervo didático e do acervo de imagens. A partir de então, tiveram início as primeiras incursões no campo da edição e editoração eletrônica de imagens e vídeos. Nossos roteiros, então, passaram a ser versões preliminares de publicação em formato de atlas fotográfico. Com o avanço do projeto, o que era para ser uma publicação se tornou uma coleção, com cinco volumes temáticos, por sistema orgânico.

Como resultado desse processo, tornamos público esse e-book contendo uma ampla coletânea de imagens de organismos, onde formas, cores, texturas e relações anatômicas em muito se aproximam da realidade em vida. Assim, possibilitamos o acesso a essa obra, a todos aqueles que desejarem aprender sobre a vida. Trazemos aqui um pouco da arte moldada pela evolução, evidenciando semelhanças e diferenças morfológicas que ajudam a compreender, em parte, essa complexa rede de relações entre os seres vivos.

Por fim, cabe destacar o papel dos estudantes, na medida em que eles foram agentes ativos ao longo desse processo de criação e desenvolvimento. Suas críticas e sugestões foram e continuarão sendo fundamentais. Essa relação ensino – aprendizagem, onde se aprende ensinando, se produz e se compartilha o conhecimento, só é factível em uma universidade como a UnB, que respeita e estimula a liberdade acadêmica. Das centenas de estudantes que passaram pela Anatomia Animal nos últimos 26 anos, muitos seguiram por outros caminhos, na imensidão de opções ofertadas pela biologia. Entretanto, alguns abraçaram essa área do conhecimento com determinação. A todos, dedico esse histórico e essa obra, que, espero, continue em evolução, visando o seu aprimoramento.

Prof. Antonio Sebben